Dependência e Codependência emocional. Você sabe a diferença?

Um sentimento que permeia muitas relações humanas é o amor. Esta emoção que só quem vive sabe, pode ser um grande mistério, é alvo de diversos escritores e filósofos famosos, tanto em perspectivas otimistas, como Kant e Byron, como nas pessimistas, como Goethe e Schopenhauer.
O amor é objeto de estudo pois faz parte das relações humanas.
Dentre as diversas teorias sobre o amor, há uma teoria chamada de “teoria triangular”, em que descreve o amor como resultado de três elementos: Intimidade, Paixão e Compromisso.
A Intimidade refere-se ao sentimento de proximidade, ligação e conexão com o outro. A Paixão envolve a ânsia de se unir ao parceiro, sendo a expressão de desejos e necessidades, como autoestima, amparo, afiliação, dominação, submissão e realização sexual. O último componente, Compromisso, consiste em dois aspectos que não ocorrem simultaneamente: o primeiro é o de curto prazo, que seria a decisão de amar ao outro e o segundo, a longo prazo, refere-se ao compromisso de manter esse amor.
Por que estou falando sobre a decisão de amar e manter o amor?
Bom, já ouvi muitas de minhas pacientes ou seguidoras usando os termos “codependência” e “dependência emocional”, como se possuíssem o mesmo significado e as afetassem da mesma maneira. Muita gente não percebe mas há uma grande diferença entre os dois e, logo, achei interessante usar esse espaço para esclarecê-la.
Antes de chegar a definição de cada termo e explicar exatamente o que os difere, preciso ressaltar que estes também possuem suas similaridades. Ambos são conceitos relevantes no contexto de abuso narcisista e mães tóxicas, mas, a principal coisa em comum entre eles, é que ambos são estados disfuncionais de um relacionamento.
É interessante que você aprenda a distingui-los, para assim, compreender a forma como cada um interfere no seu desenvolvimento pessoal, sua qualidade de vida e a qualidade das suas relações.
Codependência é um termo usado para se referir a pessoas fortemente ligadas emocionalmente a uma pessoa com um comportamento problemático e destrutivo.
Um indivíduo codependente é aquele que usa a dependência que os outros têm nele, para se sentir amado e seguro, tanto consigo mesmo como em um relacionamento.
Resumindo, é alguém que depende, da dependência do outro.
Um exemplo clássico de codependência, é o do marido ou a esposa que ignora todas as conseqüências decorrentes do alcoolismo do parceiro, como a perda do emprego, a agressividade, irresponsabilidades, etc., para garantir a “estabilidade” do relacionamento.
Ou, a pessoa que suporta qualquer tipo de abuso do cônjuge, por medo das chantagens emocionais feitas por ele, como por exemplo, a separação.
Curioso é observar a dedicação e a insistência que algumas pessoas (especialmente pais ou casais), investem naqueles com problemas de dependência ou algum outro desvio de conduta. Há casos em que a pessoa suporta qualquer tipo de comportamento – e suas consequências, sem perceber que está abrindo mão da sua própria vida e dos seus objetivos. Sem perceber que, ao fazer isso, seu próprio comportamento acaba por motivar a parte problemática do outro.
À medida que a pessoa codependente abandona suas necessidades e objetivos ao longo da vida, ela entra num processo de abandono de si mesma e de auto-destruição. Como esse padrão ocorre a longo prazo (normalmente durante vários anos), resulta em muitas perdas – perda do tempo que deveria ter sido investido em si mesmo, em seu lazer, em projetos pessoais, perda de relações que poderiam ter sido saudáveis, perda da esperança em resolver o problema do outro. Isso tudo pode desencadear alguns danos para a saúde da pessoa, seja no aspecto físico, ou no psicológico – normalmente os codependentes apresentam quadros depressivos ou ansiosos acentuados.
A dependência emocional é outra história. Trata-se de uma relação a qual existe a “escravidão” de um sujeito a outro que domina a relação. Esse caráter compulsivo determina a dependência emocional.
A dependência surge da necessidade de ser amado. Mas, se buscamos o que há por trás dessa necessidade, encontraremos uma baixa autoestima. Aquele que ama pouco a si mesmo necessita que os outros o amem para sentir-se digno.
O parceiro é alguém que não é da família de origem, que não teria motivo para me amar, mas que me ama porque escolheu isso. Não há nada de errado aí, exceto quando a própria aceitação de si mesmo, se baseia nisso.
O amor deve se basear em uma escolha livre e não em uma necessidade de estima. Quando aparece a dependência emocional, em muitos casos o amor se destrói e as consequências são negativas para os dois.
A expectativa criada pelo amor idealizado e o amor real, é o que problematiza tudo. Projetamos em nossos parceiros, uma expectativa adquirida por nossas experiências de vida, sobretudo nossas experiências familiares, faltas de validação, presença, carinho e afins.
O amor idealizado fala de um encontro amoroso profundo até a raiz da alma, incompatível com a realidade da vida conjugal comum. Na prática, acaba provocando frustração nas pessoas que querem encontrar sucesso numa fórmula amorosa tão ideal, quanto impossível. Nesses casos o desfecho é sempre o mesmo, frustração e conflito na maior parte das vezes, por querer forçar uma situação ou um modo de ser que não corresponde a realidade.
Ao nos envolvermos com alguém com qualquer atitude associada à posse e controle excessivo, pode ser considerado como amor dependente.
O ser humano se relaciona amorosamente mediante as estruturas pessoais de cada um, a identidade pessoal guia as nossas relações e seus desdobramentos, e essa identidade é continuamente formada e transformada, em relação com a maneira com que os outros nos percebem.
Quando se trabalha o amor próprio e o autoconhecimento, fica mais fácil reconhecer o gatilho que destrói nossa autoestima e nos leva em direção a relacionamentos destrutivos.
Enquanto não tivermos a compreensão da necessidade de um trabalho pessoal profundo, viveremos reféns dos nossos próprios medos.
O apego gera dependência que gera sofrimento. A liberdade em assumir o comando de nossa própria vida não é tarefa fácil, implica em abdicar uma série de amarras e, essas amarras, muitas vezes, aparecem com ganhos secundários. É fato, que ninguém é feliz sozinho.
Reconhecemos-nos no outro, mas amar sem apegos irracionais é amar sem medos.
É assumir o direito de explorar intensamente o mundo, de tomar conta de si mesma e de buscar um sentido na vida.
Depois desse texto, acredito ter ficado claro que nenhuma forma de vício, compulsão ou dependência exagerada, é saudável para nossa sanidade mental. Passamos nossas vidas em busca de nossa metade da laranja, mas o grande balde de água fria que recebemos dá conta de que não podemos ser metade de nada, se antes precisamos ser inteiros para nós mesmos.
Texto: Rafaella P.